terça-feira, 3 de março de 2009

DESCONTOS SALARIAIS - PRECAUÇÕES A SEREM OBSERVADAS PELA EMPRESA

Sérgio Ferreira Pantaleão

A Constituição Federal de 1988 contempla no artigo 7º, incisos IV, VI e X, princípios de proteção salarial, garantindo ao trabalhador a remuneração devida e os descontos previstos em Lei, constituindo crime sua retenção dolosa.

Assim dispõem os incisos IV, VI e X da CF/88:

"Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
.....
IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender as suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;
.....
VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;
.....
X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa."

Pode o empregador efetuar descontos nos salários dos empregados, desde que observado o disposto no artigo 462 da CLT, que assim dispõe:

"Art. 462 - Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo."

Portanto, qualquer desconto sofrido pelo empregado, se legalmente previsto, não implicará em prejuízo, alteração contratual ou fraude às leis trabalhistas.

As partes (empregado e empregador) deverão pactuar, com a devida anuência do primeiro, todo e qualquer desconto salarial, não acarretando assim, alteração unilateral do contrato individual de trabalho, prevista no artigo 468 da CLT.

A responsabilidade por esta situação está nas mãos do Gestor de RH, a quem cabe, antes de aceitar qualquer solicitação de desconto, orientar e alertar o empregador dos riscos de se ter que devolver valores que foram descontados ilegalmente.

Há inúmeras situações em que as empresas, unilateralmente acabam por descontar valores nos salários dos empregados sem se precaverem da formalidade do desconto, seja pela falta do documento que autoriza o desconto, seja pela falta de previsão legal, convencional ou de acordo entre as partes.

A Súmula 342 do TST, por exemplo, estabelece que todo desconto para ser integrado em planos de assistência odontológica, médico-hospitalar, seguro de vida, previdência privada, ou de entidade cooperativa, cultural ou recreativo-associativa de seus trabalhadores, em seu benefício e de seus dependentes, não afrontam o disposto no art. 462 da CLT, desde que com autorização prévia e por escrito do empregado.

Esses tipos de descontos são os mais comuns e geralmente não comprometem a legalidade perante a Justiça do Trabalho, pois as empresas já estão mais habituadas a estas situações.

Os "calos nos sapatos" estão nos descontos que decorrem da atividade em si da empresa e da função exercida pelo empregado.

É o caso, por exemplo, de caixas, fiscais de loja, vendedores, frentistas, empregados da área financeira, entre outros, em que a atividade demanda a decisão de se receber um pagamento via cheque, cartão de crédito e até mesmo em dinheiro, que, muitas vezes, não são orientados ou não há procedimentos internos que estabeleçam estas condições.

Para não incorrer em ato ilegal, a empresa deve elaborar procedimentos que estabeleçam tais condições e orientar os empregados, através de treinamentos internos, de como exercer sua função de acordo com o estabelecido, de preferência registrando estes treinamentos nas fichas de registros dos empregados, através de documentos.

Não obstante, é importante que a empresa estabeleça cláusula coletiva ou acordo coletivo que permita o desconto em folha de pagamento de valores recebidos (por meio de cheques, cartões ou dinheiro) fora dos procedimentos internos, em consonância o que dispõe o inciso XXVI do art. 7º da Constituição Federal.

A falta de procedimentos internos ou de previsão de cláusula convencional permitindo os descontos pode comprometer a empresa perante a Justiça do Trabalho, conforme podemos observar no acórdão abaixo:

RECURSO DE REVISTA. DEVOLUÇÃO DE DESCONTOS. CHEQUES DEVOLVIDOS. Pela leitura do inteiro teor do v. acórdão regional verifica-se que o Colegiado de origem entendeu, após o exame da documentação dos autos, que o reclamante não desrespeitou as regras constantes na cláusula 6ª da convenção coletiva e as exigências disciplinadoras existentes no contrato de trabalho (fl. 41), quando recebeu alguns cheques. Por essa razão, entende que não há como acolher na totalidade a tese do reclamado. Concluiu, ainda, que não havia qualquer restrição nos referidos documentos a recebimento de cheque de outras praças. Diante do consignado pela r. decisão recorrida, conclui-se que a fundamentação utilizada para dirimir a controvérsia não se situou no plano da legislação infraconstitucional que rege a matéria e sim no enquadramento da situação às regras internas da empresa e ao que ajustado mediante instrumento coletivo. Ante o exposto, não conheço do recurso. PROC. Nº TST-RR-355.497/1997.5 Ministro Relator MINISTRO BARROS LEVENHAGEN. Brasília, 14 de dezembro de 1999.

Ainda que haja cláusula específica em acordo ou convenção coletiva e havendo falha por parte do empregado no exercício de sua função, a empresa deve ponderar quanto ao total de desconto que será feito no mês, de modo que o valor descontado não comprometa todo ou a maior parte do salário do empregado, já que o mesmo precisa dispor de valores para o sustento mensal de sua família. Assim, irá agir com prudência a empresa que parcelar o desconto de forma a possibilitar que o empregado mantenha este sustento familiar.

Veja decisão recente do Tribunal Regional de Santa Catarina sobre o desconto não autorizado pelo empregado em folha de pagamento.
DESCONTO NÃO AUTORIZADO POR EMPREGADO É ILEGAL
Fonte: TRT/SC - 27/01/2009 - Adaptado pelo Guia Trabalhista
A juíza Rosilaine Barbosa, titular da 1ª Vara do Trabalho de Balneário Camboriú, condenou uma loja de roupas do município a restituir descontos indevidos nas verbas rescisórias de ex-empregada, sob o título de “faturas”.

A autora afirmou, em audiência, que os descontos correspondiam a roupas que ela “pegou” em seu nome para atender pedidos de colegas que estavam há pouco tempo na empresa e, por isso, não poderiam pegá-las em nome próprio. Segundo a magistrada, esse tipo de desconto só é válido se autorizado por escrito pelo empregado.
O empregador terá que pagar indenização também por violar, em parte, a norma que determina ao menos uma hora de intervalo durante a jornada. A autora da ação usufruía de apenas metade desse tempo, mas a condenação foi para o pagamento integral acrescido ainda de 50%, “sob pena do instituto não cumprir sua finalidade”, fundamentou a juíza.
A autora alegou também que não suportava mais as humilhações do patrão. Este, ao saber de sua insatisfação, emitiu o Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho (TRCT) constando como causa do afastamento “iniciativa do empregado sem justa causa”. A juíza determinou a retificação do TRCT para constar “rescisão indireta do contrato”, devendo a autora receber todas as verbas (aviso prévio, 13º salário e férias proporcionais e reflexos) e a indenização compensatória de 40% do FGTS.

“Por ter sido humilhada, tratada pelo réu de forma agressiva e repreendida de maneira vexatória na presença de clientes e outros empregados”, redigiu a magistrada na sentença, a autora teve reconhecido o prejuízo à sua honra.
A juíza Rosilaine determinou o pagamento de R$ 2.000,00 a esse título e fez questão de salientar que o dano moral, por ser uma lesão extrapatrimonial, não é indenizável e sim compensável. “A legislação não determina um critério específico de quantificação, sendo o valor fixado pelo julgador, orientado pelo bom-senso”, sentenciou.
O réu não compareceu na audiência inicial, tendo sido reconhecida sua revelia. Mesmo assim ainda cabe recurso da decisão.

CONSULTA AO SERASA/SPC - É ATO DISCRIMINATÓRIO NA SELEÇÃO DE PESSOAL?
Sergio Ferreira Pantaleão

Toda e qualquer empresa no uso de seu poder diretivo e assumindo os riscos da atividade econômica, tem o direito de contratar os candidatos que melhor lhe convier, de acordo com as atribuições e competências exigidas para o cargo vago.
A própria CLT estabelece que cabe à empresa e não ao empregado, assumir os riscos da atividade econômica e sendo assim, nada mais justo que lhe conceder o direito de contratar as pessoas que possam assegurar, através de suas competências, que a atividade econômica tenha uma ascensão contínua.
A questão está no exercício deste direito, ou seja, conforme prevê o Código Civil (art. 187), fonte subsidiária do Direito do Trabalho, comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
A grande preocupação do legislador foi de, dentro deste direito atribuído à empresa, assegurar que os candidatos pudessem ter uma participação imparcial e que os princípios atribuídos pela Constituição Federal do direito ao trabalho, à igualdade, à dignidade da pessoa humana, bem como o combate a qualquer ato discriminatório, pudessem ser assegurados nos processos de seleção.
Isto porque o que se vê na prática é a suposta ofensa, por parte de algumas empresas, a estes princípios, as quais se utilizam de meios considerados discriminatórios para a seleção de candidatos, dentre os quais, a consulta de débitos junto ao Serasa/SPC.
Se um candidato, inserido no cadastro de proteção ao crédito e assim penalizado por deixar de honrar com suas obrigações financeiras em razão do desemprego, é desclassificado à vaga de um novo emprego em razão do não cumprimento destas obrigações, este candidato acabará sofrendo uma dupla penalidade, pois é justamente o novo emprego é que possibilitará a sua adimplência no mercado.
Há, obviamente, empresas que contestam dizendo que situações como antecedentes criminais ou a consulta de débitos junto ao CPF (Serasa/SPC) estariam de acordo com o que prevê o art. 7º, XXXIV da Constituição, que assegura a todos o direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular.
A grande dificuldade das empresas é provar que interesses são estes, pois se presume que na verdade o interesse é de evitar que um candidato que tenha problemas junto ao Serasa ou SPC seja contratado, já que a Serasa se destina somente a consultas com o intuito de verificar a idoneidade de clientes e não de empregados, caracterizando, portanto, ato de discriminação.
A prática de atos discriminatórios que antecedem a contratação está prevista na Lei 9.029/95, a qual estabelece no art. 1º a proibição da adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso ou a manutenção da relação de emprego.
Muito embora isso necessite de provas para que a empresa sofra as penalidades previstas em lei, em muitas situações somente o fato de requisitar a consulta ao Serasa/SPC, pode ser configurado pela Justiça do Trabalho como prática discriminatória.
Não são raros, como no caso da notícia publicada pela Procuradoria Regional do Trabalho do Paraná (abaixo), casos em que empresas são obrigadas a deixar de praticar estes atos, sob pena de pagamento de multa por candidato prejudicado.
Embora sejam Liminares que, por motivo ou outro, possam ter uma nova decisão futura, é mister que as empresas repensem esta prática, procurando enfatizar as competências e qualificações dos candidatos como forma de pré-seleção, garantindo-lhes a oportunidade de demonstrar essas competências no exercício de sua função.
Não obstante, ainda que ocorra a prática, a empresa poderá evitar transtornos futuros e se eximir do pagamento de futuras ações de danos morais (individual ou coletivo), se comprovar que o que desclassificou o candidato foi a falta de qualificações e competências para o cargo e não o fato deste ter ou não o nome incluso no Cadastro de Proteção ao Crédito.
CONSULTA AO SERASA É ATO DISCRIMINATÓRIO NO PROCESSO DE SELEÇÃO DE PESSOAL
Fonte: PRT/PR - 18/02/2009 -
Adaptado pelo Guia Trabalhista
A Justiça do Trabalho concedeu liminar favorável ao Ministério Público do Trabalho (MPT) no Paraná em ação civil pública em face de agente financeiro. O banco deve deixar de consultar os cadastros de inadimplentes (Serasa e SPC) de candidatos a emprego, sob pena de multa de R$ 5.000,00 por candidato prejudicado. A procuradora do Trabalho Viviane Weffort propôs a ação, em dezembro de 2008, depois que o banco não aceitou ajustar a conduta, considerada discriminatória pelo MPT.
Durante investigação, o banco admitiu que a consulta ao Serasa e SPC fazia parte do processo de seleção de pessoal. Segundo a procuradora, a Constituição Federal garante a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. "
Na fase pré-contratual da relação de emprego, o empregador tem a liberdade de optar por quem irá contratar. Mas esta não é uma escolha livre. Apesar do sistema legal brasileiro não estabelecer regras específicas sobre o procedimento de seleção, este deve se desenvolver em harmonia com os preceitos constitucionais e, assim, o empregador poderá verificar somente os aspectos diretamente relacionados à habilitação do candidato à vaga ofertada, como a experiência profissional e a capacitação.
Ao utilizar as informações dos cadastros de proteção ao crédito na seleção de empregados, a instituição bancária deixa de contratar pessoas que, embora possuam alguma restrição financeira, não são devedores contumazes ou trabalhadores menos capacitados para ocupar aquele posto de trabalho. "Rejeitar a contratação de trabalhador devido às restrições creditícias constitui discriminação, prática que fere a honra e a moral da pessoa e de toda a sociedade", explica Viviane Weffort.